Dostoiévski e os "salvadores do universo"


Ao ler Crime e Castigo, de Dostoiévski — escritor Russo do século XIX —
algo que me deixou inquieto foi a percepção latente do cuidado que devemos ter
com os que acreditam possuir uma fórmula para um mundo melhor, à semelhança dos paraísos utópicos.


A obra, como ocorre em muitos clássicos da literatura, não deixará essa ideia na primeira linha de assimilação do leitor, mas sim nas entrelinhas. Nesse contexto, o personagem principal acredita ter um gênio digno das grandes figuras da História como Napoleão Bonaparte: pensamento que o incita a cometer assassinatos debochando dos meios que o levariam a certos fins.


Desse modo, o paralelo que traço entre Raskholnikóv, o personagem, e os "potenciais salvadores do mundo" está calcado justamente nessa arrogância hiperbólica que eles carregam, na medida em que uns dizem, por exemplo: "nós vamos acabar com o Estado para sermos plenos enquanto indivíduos"; ainda, por outro lado, os que afirmam: "iremos aparelhar completamente a máquina estatal e eliminaremos as desigualdades  sem deixar resquícios, ainda que isso custe algumas vidas".


Nesse sentido, onde deita o problema? Ora, até onde se sabe, as tentativas de realizar tais anseios — que quase sempre surgem das castas intelectuais burguesas aspirantes a heroínas, e que, por meio da repressão, então encontram as classes menos favorecidas — resultaram, ao longo da História, em rios de sangue. A tentativa Comunista Soviética deixou isso claro: milhões de mortos nas costas e mais uma mácula na existência humana. Em nada é diferente, por conseguinte, as atividades Nazifascistas do Século XX.

Com efeito, no final, tudo não passa de uma maquiavélica disputa pelo poder, cujos protagonistas se observam superficialmente no espelho e veem a personificação da salvação humana — que Maquiavel me perdoe. A diferença entre o humano transgressor da obra de Dostoiévski e os "iluminados" é que, de fato, o primeiro consegue sofrer pela culpa que descama sua consciência, enquanto os últimos acreditam estar aplicando à prática a verdadeira perfeição histórica: um paraíso melhor que o Éden.

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